Levantando Vôo e a Chegada ao Rio
A primeira experiência com o Brasil, país que mais tarde se evoluiria em uma vocação e paixão como professor universitário, pesquisdor e escritor, começou de maneira simples, caraterizada por minha criação e juventude em uma pequena vila rural em Kansas. Ganhara uma bolsa Fulbright para fazer a pesquisa de campo no Brasil para logo defender tese na Saint Louis University em Missouri nos EUA, isso em 1966-1967; o tema seria a chamada "literatura de cordel" brasileira e seu relacionamento com a grande literatura sofisticada brasileira.. Assim foi que em junho de 1966, rapaz novo de vinte e cinco anos, nascido e criado em uma vila de sete mil pessoas no centro do Estado de Kansas, USA, me encontrei a bordo da Pan Am, vôo para o Brasil, em específico para o Rio de Janeiro onde começaria uma verdadeira travessia na vida. A idéia foi voar de Kansas City, Missouri, fazer escala em Nova Iorque, e logo findar o vôo no Rio de Janeiro. Seria meu primeiro vôo comercial. Meus pais me levaram ao aeroporto em Kansas City onde a passagem aêrea devia me esperar; não estava. O pessoal da linha, a Pam Am, ligou para a Comissão Fulbright em Washington, D.C. e depois de uns minutos emitiram a passagem. Depois de uma despedida frântica e rápida aos pais, corri pelo aeroporto até a pista de decolagem onde o grande Boeing 707 já com os motores rodando, me esperava. Um tanto arfante, caí na poltrona, a aeromoça me fez apertar o cinturão, e, assim, meio fora de mim (talvez como o Inácio de “O Fígado Indiscreto” de Monteiro Lobato), comecei a aventura.
O começo dos anos 1960 era uma época ainda de grande esperança e otimismo para nós nos Estados Unidos. A Guerra de Viet Nã ainda não aumentara no lamaçal sangrento, cansativo e sem esperança do fim dos anos 1960 e começo dos 1970. Ainda era a época da "Nova Fronteira" de John F. Kennedy, dos Voluntários da Pátria, da grande Aliança para o Progresso para com os amigos da América Latina, isso, mesmo que sentíssimos todos a tristeza da morte de Kennedy em 1963. Assim foi que o vôo internacional desde Nova Yorque levava um novo grupo de Voluntários da Pátria a seus postos no Brasil, e, eu, o jovem doutorando, me encontrei com essa gente aos dois lados da poltrona. Era significante porque eu ia me encontrar muitíssimo com os voluntários em dias e meses futuros no Nordeste do Brasil, onde mataríamos saudades tomando um choppe ou uma caipirinha e falando da terra deixada para trás. Mas, aí acabararm as semelhanças; os nossos objetivos foram totalmente diferentes.
Não há maneira que os três anos de estudo da língua portuguesa, nem os cursos de literatura brasileira ou estudos latinoamericanos pudessem me preparar para o choque de chegar em uma metrópoli como o Rio de Janeiro. Descobri logo que estudar do Brasil é uma coisa; estar e morar no Brasil é outra. Sabia bem os princípios da lingua "brasileira", mas o Rio me assombrou! Ainda hoje, lembro da corrida de táxi do Galeão na Ilha do Governador através a Zona Norte (choque terrível para o jovem norteamericano), pelo centro pela Avenida Rio Branco, ao longo das praias de Glória, Flamengo, e Botafogo até entrar na incrível Copacabana onde no final deste lugar único no planeta fiquei hospedado em um pequeno hotel. Passei o tempo todo no táxi falando meu português livresco de faculdade. Não existe no mundo uma sensação igual para o estudante de idiomas do que aquela primeira vez no país da língua estudada quando a gente realmente escuta e fala o idioma estudado e se dá conta que tudo não era ficção, não. O Português do Brasil realmente era verdadeiro!
Devo frisar que um entre muitos dos elementos de preparação para o pessoal de minha geração foi o filme "Órféu Negro" de Marcel Camus, com música de Vinicius de Morais e Luís Bonfá. Quando vi no táxi que sim podia compreender bastante, se não tudo, do que falava o pessoal, e vi aquelas cenas vistas várias vezes no filme e sonhadas depois - realmente estavam em frente dos olhos meus - foi o fim da picada! Desde o pequeno hotel em Posto 6 pude ver os seis kilômetros de praia da Copacabana, em um crescente que fez lembrar imagens de lua de versos do espanhol García Lorca (também fiz espanhol na pós-graduação, de fato, foi o espanhol a língua primeira antes do "campo menor" do português). O Pão de Açúcar estava visível no fim longínqüo da praia, e o Corcovado ficava bem ao fondo no ar à esquerda. Se isso fosse o paraíso na terra, já tinha chegado a ele! O rapazinho do interior do Kansas nunca seria o mesmo. Através deste livro, sempre irei falando do pessoal da literatura de cordel e o mundo deles. Não foi menos o "ficar abismado" deste gringo ao ver a Copacabana do que o sentimento dos nordestinos "pau de arara" nas estórias do cordel ao chegarem eles no Rio a avistar o mesmo fenômeno.